páro. silencio-me abruptamente. não deixo que nenhum som saia de mim. absoluto silêncio. estico os braços à minha frente. a pele branca e sem sinais. as mãos fechadas. magoam-me as unhas compridas a rasgar as palmas da mãos. as mãos cerradas. fecho os olhos e escuto. o sangue que me percorre as veias. o sangue que flui imparável. o sangue que é meu e de que desconheço o sabor. páro. e escuto. abro os olhos. fecho as mãos ainda com mais força. os meus pulsos. dos meus pulsos saltam veias redondas, compridas, que se enlaçam noutras veias. rios e afluentes. e o sangue a correr-me por dentro. o meu sangue. o azul das veias que trespassa a pele branca e desenha rios imensos. imparável o sangue que por mim viaja.
o frio do aço na minha pele. o calor do corte. o arrepio que antecede a dor. a dor que não sinto. o sangue que aquece a pele. o vermelho que se espalha pelos pulsos, que escorre. o sangue quente que é meu e agora me envolve. os meus braços esticados à minha frente. dois vales fundos rasgados na carne. segundos que se impõem entre mim e todas as eternidades. o sangue que cai no chão. o barulho do sangue, gota a gota, na madeira acetinada do chão. o meu corpo vazio de mim. cada vez mais lento. a carne cada vez mais pálida. os meus olhos que se semicerram embora eu queira ver. as vozes que oiço ao longe, a vir para cá. o branco que me envolve. e o sangue. o meu sangue saído de mim.
[ my own personnal blood ]
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lénia rufino
9.8.05
publicado no dnjovem, edição na net, 20 de setembro, 2005
2 comentários:
Gosto da forma como escreves...
Tropecei no teu blogue por mero acaso.
Estive a ler algumas coisas e vi que escreves bem.
Continua. Eu voltarei mais vezes para te ler.
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