[ non sense ]

acendem-se cigarros que se colam uns nos outros. sorve-se o fumo em golfadas breves, porém profundas. a nicotina entra-nos pelos poros, pelas veias. obriga-nos a sinapses encapotadas e sublimes. pensamos no que fomos. sentimos aquela pequena réstia de vida a escorrer para fora de nós. vemo-nos como num filme. tela gasta, som desafinado. nós ali, longe, ausentes. o cinema fecha tarde, por isso podemos ficar. perdemos o rasto às coisas que já fomos. não sentes? consegues perceber a ausência de ti, consegues desafiar-te ao reencontro. provocas a morte como se disso dependesse tudo o que foste. provocas a memória para que subsista. espicaças coisas com as quais não tens a certeza de saber lidar. a vida é um risco, dizes. e apostas. não te deixas vencer. bluff após bluff, sais vitorioso. qual é a glória residente na mentira? de que é que podes orgulhar-te? o que é que tens que faça de ti um ser capaz? nada. absolutamente nada. apenas o facto de conseguires mentir a ti mesmo te mantém vivo. a tua vida não é mais do que uma mentira em que tu acreditas mais do que qualquer outra pessoa. insistes em assimilar falsidades embrulhadas em factos verosímeis. erro crasso, meu amor. tu não és aquilo em que queres acreditar. tu és aquilo que és, ainda que isso não te deixe dormir descansado. ainda que isso te ponha em xeque e te deixe à beira da morte. a vida é feita de jogadas falíveis, meu amor. e tu tens que aprender a viver com o homem falível em que te tornaste. nem todas as pessoas são bonitas. nem todas são ausentes de pecado. a suprema inteligência é saber-se assumir o que se é e viver tranquilamente com isso. o resto vem por acréscimo. porque ninguém acredita demasiado tempo numa mentira. porque mesmo que te enganes a ti, há sempre quem consiga ver para lá das aparências. e depois estás novamente em xeque. e acabas sempre por perder o jogo. time out.

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