| serpentes |

de repente o tempo pára. no teu relógio os segundos congelam e entramos numa dimensão paralela, uma lateralidade inexplicável, uma espécie de triângulo das bermudas factual. dizes tudo o que te apetece porque depois sairemos dessa dimensão e será como se nada fosse. escolhes as palavras dando primazia às que magoam e dilaceram. és assim: podendo escolher, escolhes ser ácido. eu oiço, ausente, mas gravo tudo o que me dizes. cada palavra é um traço feito a cinzel, sobre uma pele já demasiado escrita. andamos os dias em passadeiras rolantes contrárias: quando tu vais, eu volto; quando eu vou, tu regressas. talvez seja porque nesta dimensão paralela não há espaço para combinações. tudo são acasos e improbabilidades. depois, ainda do lado de lá, agarras-me a mão, que colocas no teu peito, olhas-me nos olhos e esperas que o tempo descongele e avance, já do lado de cá.

e eu ouvi tudo o que me disseste, como se num sonho. e apesar de recordar cada palavra, é como se não tivesses sido tu a falar comigo, é como se não tivesse sido a mim que disseste coisas impossíveis de ouvir. e eu, do lado branco da vida, esboço um sorriso magoado, porém esquecido e continuo a beijar-te como só eu sei fazer.

um dia morder-me-ás a língua e morrerás envenenado.

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